quarta-feira, 6 de junho de 2012

O retorno de Pandora


Era tarde da noite...

uma garotinha estava andando destemida pelas ruas da cidade sendo iluminada pela lua cheia de outono. Não parecia perdida, pois andava com a segurança de quem sabe para onde vai e o que espera encontrar. Ao passar pela ponte de tijolos amarelos ela se depara com uma caixa. A caixa era extremamente bela, o tipo de beleza que ultrapassa tempos e épocas. A caixa estava totalmente fechada e a curiosidade infantil de saber o que se escondia ali se misturava com o receio do inesperado.

A menina senta-se ao lado da caixa e parece estar envolvida num diálogo de pensamentos. Ela, então, não resiste à vontade de tocá-la. A frieza da caixa surpreende a garotinha que num primeiro impulso a abandona. Mas a caixa como que telepaticamente a convida a aproximar-se novamente. O metal gelado da caixa começa a esquentar-se ao toque da garotinha que a envolvia em seus braços como um abraço terno entre amigos de há muito.

Ela, então, decide levar a caixa para casa. Ao pensar na palavra ‘casa’ de repente a segurança e certeza da garota se transformam em dúvida. A palavra ‘casa’ teima em não se transformar em algo traduzível. A garota pára e tenta lembrar-se que caminhos a poderiam levar a esse lugar misterioso e aconchegante. Senta-se novamente com a caixa ao seu colo, a examina com seu olhar curioso e pensa em abri-la.

A insegurança e o súbito medo de não saber onde está e nem para onde ir se abatem brutalmente sobre a menina que de forma incontrolável começa a chorar... O cair das lágrimas sobre a caixa começa a desfazer suas travas e fechaduras tão intrincadas. Ao olhar para dentro da caixa, ela percebe que suas lágrimas transformam-se em letras que dançam diante dos seus olhos agrupando-se e transformando-se em palavras. A menina levanta-se e começa a selecionar as palavras que lhe são familiares e a formar sua própria história.

 Foi-se dito há tempos atrás que seu caminho era certo e preciso. Que tudo era como deveria ser. Que tudo seria como deveria ser. Que tudo estava decidido e só era necessário seguir.  A insegurança, a dúvida, o não- estar e o não-ser, novidades a princípio aterrorizantes se transformam no seu sentido de vida.  Não saber passa a ser seu grito de guerra e de paz. Um grito baixinho para não acordar os gigantes. Sentir, eis o seu plano mais atrevido.

Ela deixa então a caixa aberta, invisível, inerte e impotente. Segue seu caminho, sozinha, como começou, sabendo que a beleza estava nela e na poesia que criou. Ela possui tudo!

E os males da caixa? Ficam guardados para quem os quiser.

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