segunda-feira, 3 de março de 2014

Correspondência I


Café da Beira do Mundo, uma data vivida por nós,
Baby,

Não importa por quais caminhos eu transite, sempre retorno ao Café da Beira do Mundo. Aqui encontro meus amigos, filosofo com o garçom, flerto com a barista, e na varanda do estabelecimento balanço meus pés sobre o universo infinito. Toda vez que venho, peço um café diferente do cardápio: às vezes é um moka, em outras um cappuccino, todavia, de fato, meu favorito sempre foi um café simples, coado, preto e sem açúcar. Em alguns momentos, bebia-o quente como lava escorrendo na garganta, pois meu corpo era pura adrenalina e alvoroço; em outros, apreciava-o morno, e, consequentemente, a tranquilidade que emanava desse ato. Mas muitas vezes, tomei-o frio, quase gelado, e aceitei que assim fosse, porque ali estava o resultado da maturação de muitos pensamentos. A frieza do meu café me revelava a intensidade com que me envolvia em alguns dilemas existenciais, que ajudaram a formar quem sou.
Sabe, baby, você sempre esteve aqui me ouvindo, bebendo seu chá, cada dia de um tipo, em xícaras diferentes. Perguntava-me porque você jamais repetia as xícaras, e até hoje não entendo porque nunca te fiz essa pergunta simples, acho que elaborar teorias sobre era mais instigante, e assim o fiz. Creio que você todos os dias escolhia uma diferente, porque seu sonho era beber em todas as xícaras do mundo, da porcelana inglesa à japonesa, da caneca que te dei para sua viagem até a de casal que compartilhará. Ao fazer isso, acredito que com o chá você conheceria o mundo através de pequenos goles e cheiros aromáticos, e mesmo nunca estando lá, você teria estado em todos aqueles lugares. E em alguns desses momentos eu teria estado contigo.
Ultimamente tenho remoído o amor mentalmente. Talvez seja equivocado, e de repente tenha me tornado uma herege romântica, mas, e daí? Determinados crimes longe de fazer mal, proporcionaram mudanças sociais extraordinárias, quem sabe esse não me torne uma pessoa mais equilibrada, apesar de criminosa? Sempre acreditei no amor, penso que somos pessoas melhores quando amamos, mas me dei conta que o amor não é absoluto. Ele possui vários cheiros, tonalidades e toques diferentes; todavia, o que mais me dói, é que exista, e as pessoas aceitem, esse tal de amor-sacrifício. Baby, por que amar tem que significar sofrimento? Nunca entendi muito bem isso. Você ali vivendo um relacionamento difícil e desgastado, mas acreditando piamente que o amor tudo supera, salva, etc. O amor como se fosse uma entidade pairando, um master of puppets nos controlando. Quanta besteira... O amor somos nós: ou estamos dispostos, ou nada feito. O problema é que às vezes não dá para vencermos a nós mesmos, nossas manias, delírios e vontades; se não é possível ser diferente, por que não deixar o outro ir e ser feliz nos braços de outrem? Somos tão egoístas ao ponto de amargurar a felicidade do outro em nome do “amor”. Dizemos que amamos e queremos que o sujeito do nosso sentimento seja feliz... Pausa. Cláusula de exceção: somente enquanto ele estiver conosco. Uau, é muita pretensão achar que somos a única coisa que pode fazê-lo feliz, no entanto, tem gente que insiste nesse contrassenso. E você pensa que acaba aí? Não, isso é o início da derrocada, isto é, um jogo de palavras mordazes, manipulação de sentimentos e estratégias de produção de culpa.
Durante suas viagens, encontrastes um amor desprendido, sem egoísmos e sentimentos de posse? Um amor que se sente feliz em ver o outro bem? Eu acredito tanto nisso, o quê parece incomodar extremamente terceiros, que tentam arrancar minhas verdades interiores a todo custo. Sou pintada de insensível, fria, “a que nunca amou”, e me entregam o papel da prostituta flagelada para encenar. Baby, cansei desse teatro medíocre, mas, aqui neste Café que me lembra você, continuo torcendo por todos os amores que nascem e crescem todos os dias, porque todos nós merecemos amar e sermos amados, na medida do que precisamos e não na do que foi nos ofertado.
Desejo que esse amor que sente agora cresça cada vez mais, que seja imensamente amada, e ame de volta na mesma dose. Perdoa-me os erros de caligrafia, a letra difícil de ser lida e as coerências desajeitadas, mas os takes não foram feitos para serem perfeitos, e quero que me leia sempre em primeira mão.

Um abraço da irmã que te ama, e aguarda o seu retorno para um café/chá,

C. L.

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